Da janela de dentro olho o fora. E fora o que há? Existem ELES. ELES passam, me olham e acenam como se eu fosse algum importante. Algum conhecido.
O Menino passa de bicicleta. Não me olhou nem acenou. Por que não ele? Por trás do vidro da janela existe uma outra camada, às vezes vivo por entre ela. Existo nela. Três coelhos passam agora. Você viu? Rosas eles eram. Passam agora, mas eu não. Eu fico. Eu paro para examinar meu olhar. Uma senhora me contou que um amigo viveu como um poliedro. Ele era um poliedro. Acreditava que era assim e que tudo à sua volta era poliedro. Então ele se casou com uma porca, poliedro também, e pode ser feliz porque ela o entendia e ela a entendia. Algumas vezes soltava um ruído. Ruídos de Porca, mas ele não ligava. (isto eu roubei de um livro...) Como cheguei aqui nesse assunto? Perdi o Fio. Falava de atravessar, atravessar por entre as coisas...
Olhando para dentro vejo o fora. Ainda tenho dificuldades com o fora. Será que ao estar fora estou dentro? Besteiras....
Só consigo pensar em fragmentos de texto daquela velha senhora louca e por vezes cor-de-rosa. Grande escrivã,“escritória”.
E se eu me locomover agora, muda? Muda alguma coisa? Muda assunto? Mudo eu?
DESLOQUEI.
Fui para baixo de uma árvore pensar em galhos. Abro minha braguilha e rego a árvore com meu líquido amarelo.
Desloco-me novamente. Estou com os pés no asfalto sujo. As pessoas continuam a me olhar e acenar, mas eu não identifico se as conheço ou não.
Na primeira página do jornal, eu não estou lá. Talvez eu não seja ninguém.
Cheiro de comida. Se me desloco mais um pouco posso ser eu a comida. Antigamente viviam pessoa por aqui que comiam pessoas. Dizem que eram muitas. Muitas que comiam ou eram comidas. A tinta da minha caneta se esvai. Será que minha memória se esvai?
Ela olhou pra mim e sorrio. Me amou algum dia. Ele também, daquele jeito ali. A vezes parece que está tudo embaralhado. A caneta é meu tempo. Ela se esgota e eu também. Um dia terei sido um contador de anedotas antigas.....
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